domingo, 17 de março de 2013

O medo está fora do controle!


Transtorno
Fobias: o medo está fora do controle!

Estudos pelo mundo apresentam um resultado que assinala algo em torno de 25% da população ligada, de alguma forma, ao medo fóbico. Esse distúrbio pode atingir até duas vezes mais mulheres


O medo é inerente ao ser humano. Sentimos medo quando algo ameaça a nossa sensação de estabilidade, o nosso equilíbrio. As reações ao medo podem ser as mais adversas: enfrentamento, fuga ou entrega. Você já deve ter ouvido: “enfrentei o problema com a cara e a coragem”, “nem pensei,  quei com medo e saí correndo” ou “paralisei de medo”. Ter medo é uma questão natural e valida o nosso instinto de sobrevivência. A fobia é um medo exacerbado e desproporcional, que prejudica os relacionamentos sociais.
O termo fobia signi ca um medo desproporcional relacionado a objetos, situações ou comportamentos de tal monta que é considerado um distúrbio psicológico. Uma hipersensibilidade que desencadeia grande ansiedade, tornando a situação um agente estressor capaz de gerar sensações de medo e pavor em níveis tão altos que podem modi car de forma prejudicial o comportamento social de uma pessoa. Desse modo, a fobia pode causar perdas e limitar o sujeito fóbico em suas ações, podendo mesmo imobilizá-lo ou promover o surgimento de sintomas ainda mais graves com doenças psicossomáticas.
Existem estudos pelo mundo que apresentam um resultado que assinala algo em torno de 25% da população ligada, de alguma forma, ao medo fóbico. Esse extrato teve, tem ou terá, em algum momento da vida, um episódio de fobia. Os estudos também indicam, com um pouco de incerteza, que esse distúrbio atinge duas vezes mais mulheres que homens. O per l de fobia mais comum é o horror de se sentir objeto de observação e avaliação pelo outros, a fobia social!

Sintomas presentes na fobia
O aumento de produção de adrenalina e a requisição de recursos para a fuga ou ataque começam por alterar o ritmo cardíaco e a taxa respiratória. Os tremores musculares podem surgir e pode ocorrer uma hiperatividade com desorganização motora, baixo limiar para respostas motoras (“sobressaltos”), evitação ou afastamento. O modo de pensar, aspecto cognitivo, fica prejudicado, pois o organismo está de prontidão em relação ao agente estressor e, em reação reflexa, produz alterações bioquímicas de defesa aos estímulos percebidos, deixando todo o resto do metabolismo em segundo plano até que a ameaça cesse. Vômito, diarreia, choro ou desmaio podem ser consequência da impossibilidade de afastamento ou enfrentamento da situação gatilho do processo.
Alguns sintomas são de ordem subjetiva, como a apreensão, preocupação desmedida, previsão de ameaças e sensações de medo mesmo sem o objeto ou situação estressora, o que torna a vida do indivíduo fóbico, dentro deste processo, um verdadeiro inferno.
Sem o tratamento adequado, muitas vezes, ele tem de adaptar sua vida para evitar o confronto e suas consequências fisiológicas e subjetivas.

A fobia simples diz respeito ao medo intenso restrito a situações específicas, como a presença de animais, fenômenos da natureza, avião, ir ao dentista ou hospitais etc. Também envolve a preocupação sem a presença do elemento estressor
Mecanismo de defesa Segundo Jung, todo sintoma é uma tentativa de autocura do corpo. Nesse modo de pensar, o transtorno de ansiedade, base primeira da fobia, deve estar servindo como um elemento de proteção agindo de forma a preservar o corpo de alguma ameaça que, pela perspectiva do inconsciente, pode ser extremamente danosa. Esse mecanismo de defesa difere dos outros transtornos de ansiedade, pois tem uma característica especial: só se manifesta em situações particulares. Estas podem ser divididas em dois grandes grupos, como podemos encontrar na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatísticas dos Transtornos Mentais (1995), o DSM-IV, onde as fobias são assim quali cadas:
1) FOBIA ESPECÍFICA: antes denominada “fobia simples”, diz respeito a medos intensos, restritos a situações especí - cas, que podem ser claramente discerníveis como: a presença de animais, fenômenos da natureza, avião, ir ao dentista ou hospitais etc. Também pode envolver a preocupação acerca do objeto, ou seja, sentir o medo irracional mesmo sem a presença do elemento estressor.
2) FOBIA SOCIAL: a característica essencial é um medo acentuado e persistente de situações sociais ou de desempenho nas quais o individuo pode sentir embaraço. Como exemplo: falar, comer, escrever em público ou ir a festas. Um estudo mostrou que 20% das pessoas citavam medo excessivo de falar em público, mas apenas 2% se encontravam dentro do per l da fobia social. Mesmo assim, falar em público aparece em primeiro lugar entre as fobias sociais.

A fobia é um medo exacerbado e desproporcional, que prejudica os relacionamentos sociais

Já a fobia social se caracteriza pelo medo acentuado e persistente de situações sociais, como ir a festas. Falar em público aparece em primeiro lugar entre esse tipo de fobia
Medo é uma das emoções primárias do homem e surge no processo evolucionário como um alerta ao perigo. Ele pode evoluir para a raiva e transformar o sujeito numa máquina de agressividade ou para o pavor e fazer com que ele fuja do combate. Então, o medo é uma forma de ansiedade ou estamos usando palavras diferentes para a mesma sensação? Este é um problema semântico e enfrentaremos vários quando se trata de emoções, isso porque possuímos muitas nuances emocionais diferentes e, para di cultar um pouco mais, podemos sentir mais de uma ao mesmo tempo, o que iria necessitar de um cabedal com 10 mil palavras só para nominar as expressões faciais resultantes dessas emoções.
Já a fobia é o medo irracional, além da medida apropriada, para se tomar uma decisão. Dura mais tempo que o medo normal e provoca uma forte produção hormonal, altera o batimento cardíaco, inicia um processo de sudorese, altera o sistema digestivo e respiratório e, quando excessivo, pode até levar ao desmaio, uma forma extrema de fuga à situação. Além disso, o objeto desse medo intenso pode não ser tão signi - cante assim para a maioria das pessoas. Assim, uma característica da fobia é uma grande desproporção entre a emoção e a situação que a provoca, sem que tenha uma explicação razoável para isso, com ausência de controle voluntário e uma tendência à evitação dessa situação a qualquer custo.
A diferença entre fobia e medo é quantitativa: de tempo e intensidade!
• Etimologia •A palavra “fobia” deriva do grego Fobos (phobos), deus do medo, filho de Ares e Afrodite e irmão gêmeo de Deimos. Nas guerras, os dois sempre acompanhavam o pai, deus da guerra Ares. Fobos incitava um medo terrível nos inimigos, que fugiam ao se deparar com ele, sempre acompanhado de seu irmão Deimos, o terror. Interessante é que os dois nasceram de uma relação de estresse profundo, pois o marido de Afrodite, Hefesto, sabendo que ela mantinha encontros com Ares, preparou uma emboscada. Hefesto era um exímio ferreiro e montou uma armadilha que aprisionou os dois amantes em uma rede invisível. Como castigo exibiu os dois nus aos deuses numa grande humilhação pública. No entanto, Fobos e Deimos ainda têm uma irmã: Harmonia! Podemos então imaginar que, da Mitologia, vem uma lição sobre o surgimento e a possibilidade de harmonização das emoções provenientes do medo patológico.
FilogenéticaDurante a evolução, algumas “predisposições  logenéticas” (SELIGMAN, 1970) selecionaram comportamentos de evitação para a sobrevivência das espécies. Essa proposta explica uma universalidade de alguns medos, que podem passar a fóbicos, por alguma experiência traumática ou não. Em verdade, existe uma forte vulnerabilidade constitucional que predispõe as pessoas a desenvolverem transtornos de ansiedade em relação a esses medos que já vêm implantados em nossa memória genética, tais como: insetos, lugares altos ou fechados, animais predadores, escuridão, água e fogo, situações ou elementos que podem causar dano letal. As fobias relacionadas a esses gatilhos seriam, por assim dizer, mais naturais, pois bastaria apenas uma experiência mais forte para ocasionar o processo de surgimento de uma verdadeira fobia.
Isso facilita entender por que alguém que nunca teve um contato direto com o mar possa sentir medo diante da visão, pela primeira vez, da imensidão azul. Existe um programa rodando dentro do cérebro, preinstalado, que alerta sobre o perigo do afogamento. Após se sentir seguro – aprender a nadar ou adquirir uma boia –, este processo de evitação pode ser diminuído ou totalmente extirpado. Caso contrário, se, em alguns casos, ocorre um evento que quali que a água como real perigo, o medo será intensi cado a ponto de poder se transformar em uma fobia. Naturalmente, acreditamos, deve valer para todos os objetos e situações previstas como de risco pela nossa aventura evolucionária.

NORMOPATIA


NORMOPATIA


Normopatia é a patologia da normalidade. A palavra vem de NORMO (normal) + PATIA (doença, sofrimento, paixão).

O termo foi criado para retratar um certo tipo de pessoa aparentemente bem adaptada e normal, sem nenhum conflito psíquico ruidoso, neurótico ou psicótico. É uma beleza de sujeito! Sério, honesto, trabalhador, cumpridor dos deveres, bom que dá gosto! Vai à missa todo domingo, confessa e comunga.

No entanto, tudo que esse sujeito faz, acaba num impasse. Ele nunca é “sim” e “não”, ele é “nim”. Não é que ele não “saia de cima do muro”: ele é o muro! Como não consegue fazer um mergulho profundo dentro de si, acaba sendo o famoso “sem sal”. Geralmente nem consegue terminar as coisas que começa. Muita iniciativa, pouca continuativa, nenhuma acabativa.

Mas por que normopatia e não normalidade? Porque é uma normalidade falsa ou apenas aparente. É uma normalidade estereotipada ou reativa decorrente de um processo de sobreadaptação defensiva. O sujeito não é aquilo que aparenta. Aquilo é apenas a blindagem com que ele se protegeu para sequer entrar em contato consigo mesmo. É que lá dentro habitam desejos inconfessáveis.

Onde encontramos essa “normalidade”? Encontramos, sobretudo, em gente refratária: aqueles que não sentem, não choram, não se condoem. Mas também vamos encontrar essa configuração psíquica entre somatizadores, desviantes sexuais, drogadictos...

Esses sujeitos possuem pensamento operatório. Pensamento operatório é aquele tipo de pensamento feito para resolver problemas, consertar coisas, trocar pneus. Se você furar o pneu do carro, precisa ter um sujeito desses do lado. Mas precisa dizer pra ele que o pneu furou, senão ele nem vê. Eles até são capazes de resolver coisas práticas. Mas para conviver e conviver com eles é dureza! Ele transita pelo mundo com uma pobreza muito grande de expressão simbólica: dá a impressão de ser um robô. É um sujeito feito para casar, mas não para namorar!

Se você for adiantado em anos, certamente, vai se lembrar do Sr. Spock, o vulcano da Jornada nas Estrelas. Ele não entendia como os humanos não se expressassem diretamente naquilo que queriam. Ele era normopata. Aliás, nem isso, ele não era humano. Nós, os humanos, não expressamos diretamente aquilo que queremos. Com exagerada freqüência, fazemos SP-Rio via Moscou. Não existe sequer uma trilha no meio do mato em linha reta. Os humanos não andam em linha reta.

O normopata anda apenas em linha reta. Uma pessoa assim só fala de coisas atuais. Dá a impressão de que não tem história nem recordações. E, se tem, nunca se refere a elas. É um sujeito com a profundidade de um pires e a cara de azulejo de parede. Se você jogar tinta, ela escorre.

Um normopata não pede ajuda. Para ele, “está tudo bem!” Se chega a pedir ajuda, é sempre para os outros: os filhos, os pais, os cônjuges... Eles é que precisam de ajuda, ele mesmo, ara, jamais! Ele não sofre nada. Se sofre, é por causa “desses aí”. Nem preciso dizer o quanto um sujeito (ou sujeita) assim foge dos compromissos consigo mesmo. Eles escondem o problema e se escondem atrás do “está tudo bem!” O mundo é que está errado, os outros é que estão errados. Com eles, está sempre “tudo bem!”

É que o neurótico (gente comum como a gente) tem queixas. O normopata, não, ele em teorias. Tudo para ele está previamente teorizado e enlatado. A vida para ele é um bolo-de-caixinha e a receita para todas as questões existenciais é sempre a mesma. Até porque, para ele, não existem questões existenciais. Um bolo-de-caixinha ou um sorvete de máquina são muito mais variados que o modo como esse sujeito enxerga a existência.

Por demonstrarem pouca capacidade afetiva, é difícil para um normopata chorar, e a impressão de que deixam é a de serem pessoas “secas”. Vários normopatas privilegiam apenas o aspecto material da vida. “Primeiro, você ganha dinheiro, depois vem os amigos!” Já ouvi de um deles, em priscas eras. É que foi removida a capacidade de sonhar e o devaneio, tão próprios, aliás, tão exclusivos da espécie humana.

De certa forma, todos somos normopatas em algum grau. O que varia é a intensidade: o botão do volume. Também como eles, muitas vezes, atravessamos a vida presos à realidade como um náufrago a uma pequena tábua de salvação. O fato é que todos nós nos agarramos à pequena tábua de salvação apenas até que apareça um barco salva-vidas. No caso em questão, na vida de um normopata, a tábua já serve de barco salva-vidas. Tudo o que ele tem é só o que ele tem e nada mais. Triste, não?

Vem cá, como isso aconteceu? Ou o quê aconteceu pra isso acontecer?

Uma das funções da Mãe é manter a constância. Constância proporciona sensação de segurança. Se o bebê experimenta Mãe como inconstante, isso gera angústia. E o bebê resolve a angústia suprimindo a Mãe e colocando no lugar dela uma parte de si mesmo. A Mãe deixa de ser o espelho gerador de confiança. Com isso, não é mais a Mãe que fascina o bebê: ele próprio se fascina.

Viram que escrevi Mãe com maiúscula. Não se trata apenas da figura física. Mãe não é figura física (com CPF e RG). Mãe é figura jurídica (tem CNPJ). O senso comum sabe que mãe não é aquela que gera, mas a que cuida. Até o senso comum sabe que ser Mãe: cuidar, amar, zelar, é mais do que simplesmente ser mãe: gerar, parir, procriar.

Daí pra frente, durante a vida, esse sujeito sempre irá substituir a outra pessoa por qualquer outro objeto harmônico toda vez que precisar sustentar sua própria fragilidade e a procura de tranqüilidade. O objetivo será sempre eliminar a tensão. Na verdade, todos queremos isso. A diferença é que o normopata quer eliminar toda tensão.

Mas o que fazer, se as relações são sempre conturbadas? O normopata não tolera isso. Ele procura quem os idealize, quem os estime como um objeto superior. Para tanto, projeta no outro sua baixa-estima: o outro não presta. Para tanto, encontra no outro sua própria imagem idealizada. Quando ele diz: Como esse sujeito é bom! – na verdade, está apenas dizendo: Como eu sou bom!

O normopata não tolera diferenças. O fato, em si, de existir a diferença é difícil de suportar. A estratégia empregada será a de achatar as diferenças entre ele e o outro. Ele só procura objetos em comum com quem possa sustentar e manter a imagem ideal de si mesmo. Imagem ideal, portanto, frágil.

Esse sujeitos são propensos à harmonia. Mas, não se enganem, é uma falsa harmonia. Como eles rejeitam a diferença, são avessos a acolher as complexidades da convivência humana, porque nessa, eles vão encontrar as diferenças que detestam. Dessa forma, evitam questões internas complexas, reduzem a vida social, e só a mantém em alta quando se trata de lugares onde possam exibir sua superioridade estereotipada. “E aí? Como vai? Tudo bem, né!” Eles mesmos perguntam, eles mesmos respondem, e ai de quem ousar responder.

O objetivo de evitar qualquer encontro mais profundo com o outro é se proteger de qualquer encontro mais profundo consigo mesmo, naquilo que nem sempre é possível querer encontrar dentro de si mesmo. Para poder se conduzir na vida sem nenhum atropelo, um normopata se refugia no pedestal que construiu, onde ele mesmo, na certa, morre de solidão. Mas fazer o quê? É o pedestal que lhe dá a garantia da distância da diferença que ele não suporta. A Igreja Católica conhece São Simeão Estilita (não estilista, stylos é pilar em grego). Ele era um asceta sírio do século V, que passou a vida em cima de uma coluna de pedra de dezessete metros de altura. Vai entender!

Daí que esses sujeitos acabem sendo enfadonhos. No casamento, geralmente, procuram um parceiro vigoroso e interessante, desde que ele não constitua um desafio à baixa auto-estima. Uma geladeira sempre procura outra geladeira; vez ou outra, procura um fogão. Os parceiros são o objeto de idealização. Mas é preciso muito cuidado: a imagem que ele faz do outro se quebra com muita facilidade. O vidro desse espelho é muito fino. É preciso sempre pisar em ovos, “pois qualquer desatenção, faça não, pode ser a gota d’água!” Para o espelho não se quebrar tem sempre que dizer “sim”. “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?” Nesses casos, existe sempre um espelhamento empático: como o do bebê e sua mãe. Lembram-se que o bebê não mama leite? O bebê mama olhar. Mas o bebê cresce, não é!

Essas pessoas não suportam críticas nem julgamentos. Diante de qualquer crítica, desponta vigorosa a agressividade. Toda vez que o espelho se quebrar, surge a ansiedade, ansiedade gera vazio interno, vazio interno produz agressividade. Ataques de ansiedade geram descarga de pânico. Esse pânico é a raiva projetada a fim de restaurar a harmonia.

Esses ataques, panicosos ou agressivos, removem a alteridade diferenciada. O outro (diferente) é uma ameaça que precisa desaparecer. O normopata faz tábula rasa da vida. Porém, responda, há castigo pior? Esse procedimento empobrece os sentimentos, a criatividade, a vida. Desaparece a expressão criadora. Desaparece a capacidade de luta. Lutar implica reconhecer diferenças. O normopata se refugia com medo da diferença. Que sujeito “sem sal”!

O homem, antes de ser um animal racional (como propôs Aristóteles) é um animal simbólico. O homem e o castor fazem a mesma coisa: diques e pontes. O homem e o joão-de-barro fazem a mesma coisa: casas populares. O homem e o macaco procriam: geram prole prolixa! A diferença é que o homem convida para a inauguração, corta a fita, chama a banda, faz churrasco, mostra a casa para os amigos, dá nome aos filhos e sonha com o que eles serão quando crescerem. Nenhum outro animal faz isso.

O homem cria símbolos. O símbolo vem da capacidade de sonhar e do devaneio. A conseqüência da ausência de símbolos se traduz numa ausência de afeto e num sério transtorno cognitivo. Para quem lida com a questão religiosa, está aí a raiz do materialismo ateu. O normopata é um ateu, mas nem isso ele sabe de si.

Perdoe-me o pleonasmo, mas o homem é uma singularidade única. Você é uma singularidade única! O que faz de você “essa singularidade”, o que faz você ser você e não outro, a sua impressão digital da alma é a sua capacidade de sonhar e de se expressar cognitiva e afetivamente através de símbolos.

Você é singular. Não existem estatísticas a não ser para a matemática. A normalidade não tem nada a ver com estatística. A normalidade só pode ser concebida de acordo com a lógica interna de cada um, na sua relação consigo mesmo e com os outros.

Mas, e agora, como definir o que é normal? Direto para o início da vida! No início da vida, você não tinha recursos para distinguir o normal e o anormal. Aliás, naqueles gloriosos dias, você sequer tinha recursos para distinguir realidade e alucinação.

O primeiro passo da criança diante da fome é alucinar o seio. Ela vive um estado inicial de fusão entre ela e a mãe. A mãe e ela são uma coisa só. Aos poucos, ela vai perceber o seio como separado dela. Isso acontece depois de muitas e sucessivas experiências de satisfação e frustração. Essa alternativa – satisfação-frustração – possibilita a construção de uma noção de realidade. Começa bem cedo a mais importante aquisição da nossa espécie: a distinção entre eu e não-eu, entre eu e outro. Sim, porque no comecinho, tudo é só “Eu”. Muita gente permanece assim até o finzinho!

Quando essa distinção não é feita, a criança continua pensando que ela e mãe são uma coisa só. Conseqüência Nº 1: o mundo e ela são uma coisa só. Conseqüência Nº 2: o mundo tem de se adaptar a ela e fazer só o que ela quer. Vocês conhecem pessoas que só aceitam o mundo do jeito delas?

A primeira lei do pensamento é essa: tudo o que acontece é percebido e tudo o que é percebido deixa rastro. Aristóteles dizia que nada está no intelecto sem que primeiro não tenha passado pelos sentidos. A gente percebe até quando dorme: é comum sonhar com campainha quando o relógio toca.

Portanto, se algo aconteceu e não deixou rastro, alguma interferência muito séria houve. Algo entrou aí, nesse meio, e interceptou a comunicação de tal forma que, você sabe que deveria estar, mas não está. Quando a interferência é muito séria, ocorre da marca ser apagada antes de ser produzida. Nesse caso, o rastro do percebido não chegou a ser incluído para depois ser excluído. Ele não é nem incluído nem excluído, e nem por isso deixa de ser. Quando isso acontece, o que fica no lugar é um vazio.

A princípio, existem duas realidades: a realidade externa e a interna, o mundo de fora (que chamamos de “realidade”) e o mundo de dentro (que chamamos de “fantasia”).

Mas, agora, nós sabemos que existe uma terceira realidade. Primeira realidade: a interna. Segunda realidade: a externa. Terceira realidade: o vazio. O vazio é o externo que não virou interno. Ele ocupa tanto espaço e é tão denso que dá até pra cortar com faca.

O normopata não confunde os dois mundos: interno externo. Para ele, os limites desses mundos são muito claros, até porque, para ele, o que existe é só o mundo externo. O mundo interno, povoado de desejos e fantasias, não existe. “É coisa de quem não tem o que fazer!” É que ele vive no terceiro mundo: o vazio. Ele se aloja no vazio. Como um caramujo que carrega a concha e se protege, mas sozinho, dentro dela.

A realidade interna é suprimida. A realidade externa é super-investida de modo compensatório. Na verdade, compensatório, do quê? Da perda das associações. Porque as associações vão trazer lembranças, as lembranças trarão diferenças, e as diferenças incomodam tremendamente. E é disso que o normopata foge: das lembranças e das diferenças. “Para mim, só interessa o presente, o hoje.” “Quem vive de passado é museu.” “Eu não me lembro de nada” (Um caso sério de amnésia!) “Só lembro daquilo que eu quero.” (Chave de disjuntor?) Quanto mais frágil o objeto blindado, maior há de ser a blindagem. Não se lembrar de nada é uma boa blindagem.

Pois é, que bom se fosse assim! Que bom se a gente tivesse o controle onipotente de tudo! Seria tão fácil fazer regime! Mas a vida não é assim.

Qual é o resultado da normopatia?

Resultado para a vida emocional
O sujeito funciona como um robô impessoal e estereotipado, se tratando sempre na 3ª pessoa (a gente!). Há quem atenda ao telefone e responda: “Ele!”, no lugar de “Eu!” Contam que Edinho, filho do Edson Arantes do Nascimento, um dia, abriu a porta e gritou: Mãe, o Pelé chegou! Era tamanha a distância entre eles que o menino conhecia o Pelé da TV, mas não o pai. O resultado...

Resultado para o corpo
Angústias difusas: sobressalto, inquietude, ansiedade expectante. Insônia, vertigens locomotoras, agorafobia ou claustrofobia, maior sensibilidade à dor, afecções psicossomáticas e alimentares.

Resultado para as relações
Casamentos desastrados já na lua-de-mel. Empregos e faculdades que começam e não vão em frente. Alguém traduziu isso assim: “Muita iniciativa, pouca continuativa e nenhuma acabativa!” Retração narcísica e embotamento afetivo. Desinteresse pela vida, por tudo e por todos. Perda do sentido da transcendência (tudo é só aqui e agora).

A maior tarefa para quem acompanha um sujeito assim é ajudá-lo a construir a própria história. Construir mesmo, entende? Há pessoas além do peso e da idade, mas sem nenhuma história pessoal. É preciso colar as figurinhas no álbum. Em muitos casos, é preciso, até, inventar as figurinhas para serem coladas. Dá uma canseira! Eu brinco sempre que, geralmente, as pessoas nos procuram para desatar os nós. Nesses casos, diante de um normopata, a gente tem de inventar a corda.

O Modelo Cognitivo de Aaron Beck

O Modelo Cognitivo de Aaron Beck




Este conceito da terapia cognitiva é ligeiramente diferente do conceito de imagem principal do Guia do Pathwork. A imagem principal é uma idéia geral e vaga sobre o mundo e sobre a vida, no qual o eu vai tentar se adaptar. No final, a imagem principal do Pathwork também produz um conceito de eu distorcido, mas cuja descrição é diferente e baseada não em padrões de cognição, mas em padrões de tensões musculares. Resumo por Andre Barreto.

  1. A crença central é sempre uma visão do eu que é distorcida, baseada em experiências dolorosas da infância.

  1. A atitude é sempre uma visão de que algo é terrível. Tal acontecimento é o mesmo que morrer.

  1. A suposição é um encadeamento lógico de solução que está baseado na crença principal.

  1. A regra vai tomar forma de “sempres” e “nuncas”, como soluções simplistas e nem sempre aplicáveis para se vencer na vida e se conseguir o que se quer.




  1. Pensamentos automáticos.

  1. Um fluxo de pensamento que coexiste com o fluxo de pensamento mais manifesto.

    1. Experiência comum a todos nós.

    1. A maior parte do tempo, mal estamos cientes deles. Com um pouquinho de treinamento, aprendemos a trazer estes pensamentos à consciência, e então podemos fazer uma checagem de realidade (se não estamos sofrendo de uma disfunção psicológica).

    1. Uma vez que as crenças subjacentes sejam identificadas, os pensamentos automáticos se tornam bastante previsíveis.

    1. Estamos preocupados em identificar os pensamentos que são disfuncionais, ou que não correspondem à realidade; Que são emocionalmente aflitivos; e que nos impedem de atingir nossa meta.

    1. Pensamentos automáticos são quase sempre negativos, com exceção aos casos de transtorno de personalidade narcisistica, uso de drogas, e pacientes maníacos ou hipomaníacos.

    1. Nós em geral estamos mais conscientes da emoção causada pelo pensamento que do pensamento em si.

    1. Forma abreviada do pensamento automático: “Oh não” pode ser traduzido em “Meu facilitador vai me dar tarefa de casa em excesso”.



    1. Forma verbal ou visual, ou ambas. No exemplo acima, a pessoa pode ter tido uma imagem de si mesma fazendo a lição, sozinha, tarde da noite.

    1. Primeiro tipo. Pensamento automático de validade: Afirmação distorcida, que ocorre apesar de evidencias em contrário.

    1. Segundo tipo: Afirmação correta, que leva a conclusões distorcidas. “Eu não fiz o que prometi a minha colega, portanto, sou uma má pessoa.”

    1. Terceiro tipo. Pensamento automático de utilidade: É preciso, mas disfuncional: Exemplo: “Eu vou levar horas para fazer tudo isso. Ficarei acordada até às três da manhã”. Embora o pensamento tenha sido correto, ele aumentou sua ansiedade, diminuiu sua concentração e sua motivação. Uma resposta adaptativa de utilidade seria: “É verdade que levará um longo tempo para terminar isso, mas eu posso fazer, já fiz isso antes. Será melhor concentrar-me em terminar uma parte em um momento e dar-me crédito por tê-la terminado.”

    1. As pessoas em geral aceitam seus pensamentos automáticos como verdadeiros, sem reflexão ou avaliação. Avaliar a utilidade e/ou validade dos PA geralmente produz uma mudança positiva de afeto.

  1. Técnica para identificar os pensamentos automáticos.

  1. Pergunta básica: “O que estava passando pela sua cabeça neste momento?”.
  2. Faça-se esta pergunta quando você perceber sua mudança de afeto.
  3. Durante a revisão diária tente se lembrar da situação problemática ou momento durante o qual experimentou a mudança de afeto e faça a pergunta acima.
  4. Outras perguntas para fazer a si mesmo, se as técnicas acima falharem:
  5. “Sobre o que você acha que estava pensando?”
  6. “Você acha que poderia ter pensado sobre_______ ou ________?”
  7. “Você estava imaginando algo que poderia acontecer ou algo que já aconteceu antes?”
  8. “O que esta situação significou para você, ou diz para você”?

  1. As crenças centrais.

  1. Idéiam mais centrais das pessoas a respeito de si mesmo/a.

  1. Duas categorias: desamparo e desamor.

  1. Desenvolveram-se na infância, conforme a pessoa encontrou situação que confirmaram essa idéia.

  1. Podem ser positivas ou negativas.

  1. Crenças centrais negativas podem vir à tona em momentos de aflição.

  1. São mais inconscientes que os Pensamentos automáticos.

  1. Crenças centrais podem ser também generalizações sobre as outras pessoas, sobre o mundo, etc.

  1. São globais, absolutistas e supergeneralizadas.

  1. Quando são ativadas, o cliente filtra as informações que as apóiam, e falham em reconhecer ou distorcem evidencias em contrário.

  1. Quando estamos em aflição as identificamos com maior facilidade.

  1. Categorias de Crenças centrais.

    1. Crenças centrais de desamparo:

  1. Eu sou desamparado.
  2. Eu sou impotente.
  3. Eu estou fora de controle.
  4. Eu sou fraco.
  5. Eu sou vulnerável.
  6. Eu sou carente.
  7. Eu estou sem saída.
  8. Eu sou inadequado.
  9. Eu sou ineficiente.
  10. Eu sou incompetente.
  11. Eu sou um fracasso.
  12. Eu sou desrespeitado.
  13. Eu sou defeituoso (não chego à altura dos outros).
  14. Eu não sou bom o suficiente (em termos de conquistas).

    1. Crenças centrais de desamor:

  1. Eu não sou capaz de ser amado.
  2. Eu não sou capaz de ser querido.
  3. Eu sou indesejável.
  4. Eu não sou atraente.
  5. Ninguém me quer.
  6. Ninguém liga para mim.
  7. Eu sou mau.
  8. Eu não tenho valor.
  9. Eu sou diferente.
  10. Eu sou imperfeito (portanto, os outros não irão me amar).
  11. Eu não sou bom o suficiente (para ser amado pelos outros).
  12. Eu estou a ponto de ser rejeitado.
  13. Eu estou condenado a ser abandonado.
  14. Eu estou a ponto de ficar sozinho.

    Veja quadro resumo abaixo no link:

    Quadro resumo

  1. Exemplo vertical do modelo aplicado.

  1. Crença central: “Eu sou inadequada”.

  1. Crença intermediária: Atitudes, suposições e regras.

  1. Atitude: “è horrível ser inadequada”.

  1. A partir desta atitude, a pessoa pode adotar dois tipos de estratégias compensatórias: De um tipo ativo e de um tipo passivo. Aqui entra a inclinação da personalidade.

  1. Suposições: “Se eu trabalhar muito duro, então posso fazer bem as coisas.” (Estratégia compensatória ativa).

  1. Regras: “Eu deveria ser excelente em tudo o que for fazer”; “Eu deveria sempre me esforçar ao máximo”.

  1. Pensamento automático: “Eu não posso fazer isso, é difícil demais, eu jamais entenderei isso”.

  1. Uma estratégia compensatória passiva, a suposição poderia ser: “Se eu nem tentar fazer as coisas, talvez eu não sofra com a frustração”.

  1. A regra neste caso: “Eu nunca tentarei para não me frustrar”.

  1. Pensamento automático neste caso poderia ser: “Eu sou tão inadequada”. Ele reforça a crença central e perpetua o ciclo vicioso.

  1. Exemplo horizontal.

  1. Situação – pensamento automático- emoção-reação fisiológica - comportamento.

  1. Situação: Conversando ao telefone com Donna.

  1. Pensamento automático: “Ela não deve mais gostar de mim”.

  1. Emoção: Triste.

  1. Reação fisiológica: Aperto na garganta.

  1. Comportamento: Fica distante e termina logo a conversa.

    No link, um esquema da situação descrita acima:

    "Eu sou inadequada"

    Veja também este outro exemplo:

    " Eu sou incompetente"
Fonte: Terapia Cognitiva. Teoria e prática. Judith S. Beck.